Durante anos ouvimos políticos, estudiosos e populares dizerem que o povo brasileiro não é muito interessado por política, que não exerce seus direitos como cidadão e não fiscaliza os atos governamentais. Sabemos sim, que o povo brasileiro, se comparado ao francês é realmente um povo bem mais tranquilo, para não dizer manso. A massa não participa do debate público. Na maioria das vezes, discussões importantíssimas, cujo conteúdo tem o condão de modificar até mesmo estruturalmente as vidas da coletividade, têm como participantes apenas personalidades intelectuais ou indivíduos de poder aquisitivo considerável, os chamados "mais esclarecidos". No entanto, sabemos também, que o número de indivíduos que compõem essas classes é extremamente reduzido, enquanto, a opinião da "massa" popular, que é a grande "massa" decisora do país, é praticamente nula, e assim, uma vez que não opinam ou quando opinam, opinam mal, deixam o caminho livre para governantes mal intencionados.
Então, instantaneamente nos vem a indagação: Por que o povo brasileiro é assim, tão desinteressado? A resposta pode ser mais complexa do que imaginamos. Obviamente que só vemos a ponta do iceberg. De fato, a educação no país, desde os níveis mais fundamentais ainda é muito deficitária e, certamente, parte dessa inércia popular está ligada a este aspecto. Porém, temos também como grande fator colaborador a segunda fonte de educação do povo brasileiro: a televisão. Esta sim, lamentavelmente, é a "grande" professora, presente em 99% do país, inclusive, presente em muitas regiões onde o ensino escolar ainda nem chegou. No entanto, sabe-se que não é este o cerne da questão, mas sim o conteúdo que é transmitido. Sabe-se muito bem que, atualmente, a maior parte dos programas apresentados pelas emissoras de televisão não possui qualquer conteúdo didático, nada que sirva para instruir os jovens ou adultos. Ao contrário disso, o que presenciamos diariamente na televisão é um festival de inescrupulosidade e falta de educação que extrapola os níveis da decência. A exemplo disso, basta citarmos a febre mundial dos reality shows. Mas, enfim, não entremos nesse mérito e sigamos à diante.
Dessa forma, sob uma análise geral, percebe-se, rapidamente, que a grande raiz do problema é a falta de conhecimento! Se observarmos bem, percebemos que o cidadão brasileiro só é realmente cidadão durante as eleições e mesmo assim, por pura obrigação. A grande maioria do povo brasileiro não foi apresentada à Constituição Federal e, se depender de alguns governantes, nunca será apresentada. Mas por quê? Por que será que a única parte da Constituição que o brasileiro conhece é a que trata dos deveres e obrigações? Como seria possível um cidadão participar efetivamente do cenário político, exercer o controle, que possui por direito, sobre os atos governamentais? Obviamente isso jamais ocorrerá se considerarmos que o povo nunca sequer viu a tão famosa Carta Magna e muito menos chegou a ler o artigo 5º.
Muito "estranhamente" os políticos não demonstram qualquer interesse em instruir o povo brasileiro na parte que seria a mais importante dentro de um ambiente democrático. Até hoje apenas três políticos chegaram a propor a implantação de disciplinas ligadas ao direito constitucional no Brasil, em São Paulo, Mato-grosso e na Paraíba. No entanto, foram fortemente atacados por todos os lados e obviamente não seguiram em frente.
Indubitavelmente, essa seria a única maneira de transformar o povo brasileiro de inerte para um povo verdadeiramente ativo e acima de tudo consciente e Cidadão. Instruir melhor a população no que se diz respeito a noções básicas constitucionais. Deveria ser obrigatória nos colégios e não a nível estadual, mas sim nacional. Lamentavelmente, o povo brasileiro não conhece direitos fundamentais, tais como o direito de petição, direito de certidão, habeas data e ação popular, o povo brasileiro não conhece os remédios e instrumentos constitucionais para o exercício de uma cidadania propriamente dita.
A implantação de uma disciplina relacionada à cidadania incluiria o povo brasileiro nas discussões políticas e abriria os olhos de cada cidadão para um novo mundo, um mundo efetivamente democrático e participativo. Dessa forma, muito provavelmente seja possível que, um dia, os cidadãos brasileiros aprendam a ser como os franceses, que conhecem seus direitos e que, diante do menor sinal de injustiça social ou corrupção vão as ruas lutar e protestar por justiça em todos os sentidos da palavra. Somente assim é possível ser verdadeiramente um cidadão.
(PS: Estou tentando publicar este texto também no Jornal do Brasil, portanto, caso o encontre lá não estranhe.)